Marília conheceu Roberto aos dezenove anos, logo após o primeiro dia de aula na universidade. Agora ela tinha 22 anos, ele 24 e eram apenas “colegas” de classe, não para ela que se apaixonara por ele aos 20. Cursavam o 6° semestre de engenharia de produção na Universidade Federal da Bahia (UFBA). Marília secretamente pegava-se olhando para Roberto admirando aqueles olhos castanhos, aquela pele suave e os escorridos cabelos negros que adicionavam formosura a sua face. Ele tinha um apreço particular por ela, a única reservada da turma, a “santinha” que nenhum garoto havia xavecado durante o tempo que se conheciam, não pela beleza, não mesmo, a garota era extremamente bela, com madeixas longas e roupas estilosas, sorrisos iluminados e olhar fortemente secreto, mas muito fechada e ligeiramente grossa. Foi o intervalo da aula de informática que Marília sentiu o garoto vindo na sua direção. Ela foi fria, mas por quê? Sempre foi apaixonada por ele. Não podia, não só ele, mas a todos, não podia mais sofrer. Roberto não desistiu e frequentemente conversavam nos intervalos, chegadas e saídas, dexaram-se envolver e um mês e meio após estavam “ficando”, como dizem os jovens no namoro sem compromisso e era isso que ele pretendia dizer a todos que pegou a intocável boneca engenheira. Começaram a namorar, por insistência dele e fraqueza dela, desfilavam apaixonadamente pelos corredores da faculdade, era a fase mais feliz da vida da estudante. Beijavam-se constantemente entre os amigos que logo após o namoro ela ganhara e confiara, tudo era novo, menos o medo. Luísa, amiga de Marília desde a infância, era o seu diário freqüente, contava seus sonhos, opiniões, conclusões e dividia a dor que carregava há tempos. Durante uma caminhada pela culta biblioteca municipal, Luísa ouviu estalos amorosos e sussurros secretos, viu entre os espaços das prateleiras Roberto e Joana, a garota do segundo semestre de odontologia, ela sentiu-se dividida entre uma farsa estúpida de Roberto e um amor surreal de Marília. Resolveu contar que havia presenciado quando o telefone tocou, era da universidade avisando-a que Marília foi encontrada no banheiro com os pulsos cortados; um suicídio e uma carta que dizia o seguinte: “Hoje eu saí com o Roberto e contei para ele que tinha AIDS, ele apontou-me como todos os outros, afirmou que jamais me tocaria sabendo que era defeituosa.” “Não pude suportar a dor de mais uma vez amar um ser que me odiava por uma doença que acabara de me vencer, não porque morri por ela, mas porque me entreguei a ela.” “Roberto, eu o amo mais do que a mim mesma, esse foi o meu erro, enquanto você apenas brincava eu acreditava na diversão e quando eu me dei conta já era tarde. Você me abandonou no instante em que mais precisei de você, tirou-me as forças, fiquei mais frágil que antes e resolvi me matar, não porque você não me ama, ou não me amou, mas para não cair na conversa de outro insensível que nem você. E mais uma coisa, lembra ontem a noite? A camisinha furou, por isso resolvi te contar a verdade e dar-te boa sorte, para lutar contra o próprio preconceito e sentir na pele o que você fez comigo e que várias pessoas farão com você.”
Marília Gudafternon Andrade
* 12/05/1985
† 24/09/2007
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