Eu nasci bem grandinho e gordinho, não sei como a mamãe conseguiu me tirar dela. O papai me contou que ela me carregou nove meses até eu sai da sua barriga, eu não entendi bem o que são nove meses, eu só tinha quatro anos, mas papai disse que era muito tempo, a mamãe me ama mesmo – eu pensei.
Embora muitas crianças amassem bola, carrinhos, lutas e entre outros brinquedos masculinos eu gostava mesmo era de televisão, não tinha um programa favorito sabe, eu gostava de tudo. Mas tinha umas mulheres que beijavam os homens na boca você acredita? – indagava sempre – Eu ficava bestificado, mas a mamãe tapava os meus olhos, dizia que isso era coisa de gente grande, ela não sabia que eu já era quase um adulto.
Um dia eu estava vendo o bob espoja quando tudo parou e aquela mulher do jornal da noite anunciou a morte de um cantor super famoso que havia sofrido um acidente terrível. O que mais me espantou foi que em todos os jornais e programas só falavam nesse tal cantor aí que até a mamãe era fã, eu que não era fiquei sentidíssimo. Quando o papai chegou do trabalho perguntei:
_ Papai, o que é morrer?
_ É quando uma pessoa vai ficar com papai do céu filho.
_ E quando ela volta?
_ Ela não volta mais Josh, ela fica lá com papai do céu, porque o seu tempo na terra acabou e agora ela foi pro céu.
Eu não notei, mas o papai fez o maior esforço pra explicar pro filho dele de quatro anos o que significava a morte e claro ele explicou como a maioria dos pais explicam as crianças.
_ Papai porque na TV passa a mesma coisa todo tempo?
_ Filho, quando a pessoa é muito importante, uma autoridade ou quando tem muito dinheiro a TV passa muito sobre sua morte, como este cantor.
_ Ah!
Eu não entendi muito o que é morrer, mas pelo pouco que aprendi não quero que nem o papai nem a mamãe morram.
Nossa vida continuou normal, papai trabalhava o dia todo e a noite estávamos juntos, éramos amigos e eu confiava nele, mas a mamãe era o meu xodó, quando chegava da escola ela estava lá me esperando para almoçar, me colocava pra dormir, me ajudava nos deveres de casa e me abraçava quando eu caía e sangrava. Ela era realmente a minha mãe, por isso eu sofri tanto quando ela morreu, poxa eu só tinha 5 ano quando tudo aconteceu, a mamãe tava bem, ela acordou de manhã cedo e me deu bom dia. O papai veio conversar comigo naquele dia e disse-me:
_ Filho, a mamãe ficou muito doente e quando uma pessoa fica doente ela precisa descansar.
_ Se você quiser papai, eu dou um chá pra ela na cama.
As lágrimas caíram dos olhos dele quase que involuntariamente, então o papai respirou fundo e completou:
_ Filho, a mamãe, ela foi ficar com papai do céu.
_ Ela morreu papai? – perguntei
_ Morreu! – ele pronunciou rapidamente
_ Não papai, eu não quero que ela morra, por favor, fala com papai do céu.
Eu não sabia o que eu estava sentindo ali, eu só tinha cinco anos e não queria ficar sem a mamãe; e se ela não gostasse de papai do céu? – pensava inocentemente.
O meu pai não me deixou vê-la no caixão e nem ir a sua sepultura, então eu fiquei em casa vendo TV o dia inteiro, não comia, nem bebia, nem falava; eu estava esperando que aquela mulher do jornal mostrasse a mamãe, mas ela não apareceu, o que será que aconteceu?
O papai chegou logo cedo e quis colocar-me para dormir, mas eu tinha que esperar e ele apreensivo perguntou-me:
_ Por que você não sai da frente desta TV. Vamos dar uma volta?
_ Eu estou esperando a mamãe passar no jornal pai.
_ Como assim? Ela não vai passar filho.
_ Mas papai, ela é importante, quando ela fala eu obedeço, minha professora disse que quem obedece é a alguma autoridade e ela tem muito dinheiro, eu vi o senhor dando pra mamãe. Ela vai passar!
Papai não conseguia me explicar, ele me abraçou fortemente e chorou muito, eu coloquei a sua cabeça no meu colo e ficamos esperando juntos a mamãe na TV.
Naquele instante obscuro da minha vida, nada me fazia não crer da importância que a mamãe tinha. Eu só queria dividir aquela dor com o que mais gostava, eu só queria que TV se compadecesse comigo e com a minha família, assim como aquele cantor, a gente também era importante.
Tornei-me historiador e busco mostrar para a sociedade o quanto eu tinha razão aos cinco anos, o quanto cada ser tem o seu valor e o quanto só alguns são valorizados. Aquele meu velho pai nunca esqueceu na minha ingenuidade e veracidade. E eu continuo vivendo e acreditando que um dia seremos todos iguais, enquanto isso a mamãe me espera bem ao lado de papai do céu.
Nenhum comentário:
Postar um comentário