sábado, 31 de outubro de 2009

• Quando a vida me criou



Estava frio naquele dia, eu vagava sozinho pela cidade, escura, silenciosa. Moro na rua desde os 16 anos de idade, logo depois da morte da mamãe. A nossa casa meu padrasto se apoderou, meu quarto, minha bicicleta, meu feijão. Não consegui mais viver ali. Meu irmão e eu éramos diariamente saco de pancadas de um alcoólatra ignorante e com uma pedra no lugar do coração. Então fugimos, mas na rua ninguém é de ninguém, nem mesmo eu e meu irmão, que mesmo tão ligados, nos separamos alguns meses depois da fuga.
No começo foi muito difícil, eu dormia numa calçada do centro da cidade, no frio, com fome, com sede, sem amor, sozinho. Comecei a pedir dinheiro na rua, entretanto era julgada como ladrão, drogado, intocável. As mães tinham medo quando eu encostava, os filhos automaticamente levantava a mão e meu odor era excluído das suas narinas. Foi quando eu decidi no auge dos 19 anos ir para a capital. Ao chegar a Salvador, de carona em carona, deslumbrei-me com o encanto do local e pensei no Rafael, meu irmão, daria tudo naquele momento para ele estar junto a mim.
Alguns meses de estadia alguns companheiros me o ofereceram drogas, na verdade não sabia ao certo do que se tratava, mas lembro que no dia anterior havia visto na TV de uma dessas lojas do comercio a frase que dizia “Dizia não as drogas” foi aí que eu disse não, mas apanhei como se fosse obrigado a dizer sim.
Nos dias quentes sentia sede e me lembrava da água que eu desperdiçava brincando de jato d’água quando a mamãe ainda estava por perto, nos dias frios me recordava das noites em que ela me cobria. Nos dias de fome me lembrava que aquela comida que eu joguei fora me saciaria. Não tinha presente de natal e nem de aniversário, catava latinhas no carnaval e no são João e minha vida resumia-se numa miséria e infelicidade. Foi quando eu resolvi mudar, me matriculei numa escola pública de Salvador para concluir o ensino médio, lá tinha poucos amigos e apenas dois sabiam que eu morava na rua. Comecei a lavar carros, catar papelão nos horários opostos as aulas. Três anos depois me formei, fui procurar emprego e achei, iniciei meu primeiro trabalho digno e vagarosamente fui saindo das ruas, aluguei um quartinho numa pensão barata perto do meu trabalho, eu era entregador em um restaurante na lapinha.
Um dia ao chegar em casa eu na minha solidão e nos meus pensamentos criei coragem e, alguns meses depois estava numa sala ar condicionada cheia de mauricinhos em busca de uma profissão. Com algumas aulas extras cedida por ex-professores, consegui o impossível, passei em medicina e hoje trabalho numa das maiores redes de hospitais de Nova York. Fiz a primeira cirurgia cardíaca anestésica e salvei uma vida que outros médicos deixariam morrer. Mundialmente reconhecido, reencontrei o Rafa e, quando os nossos olhos, 22 anos após se encontraram, tive a sensação de que eu fui filho da vida e, emoção nenhuma igualaria-se aquela.
Quando voltei a Salvador para alguns eventos, fui a um restaurante em Itapoã e vi um menino na porta que me perguntou: “Tio você tem um trocado?” e eu olhei nos seu olhos e respondi: “Não meu filho, eu tenho sonhos”.

sábado, 24 de outubro de 2009

• Pensamento Ortográfico

“Eu vivo de acordo com as regras, independente de qual seja ela”; diz Maria, com sua teoria, com o seu sarcasmo egocêntrico, à professora de português logo após um trabalho proposto pela mesma.
No dia sucessor, chega à garotinha com o trabalho em mãos e feito por ela, lendo um texto que dizia assim:
“Por que logo um traço foi o meu tema? Está bem professora, hífen. Mesmo assim para mim, tudo se resume em uma mínima linha que liga palavras e as separa também.
Mesmo de acordo com as regras, eu não as suporto. Onde já se viu o meu mico-ondas separar-se? Extraconjugal, juntar-se? E até o meu humor se muda quando o composto bem-humorado é pronunciado.
Já escrevi pré no oeste e conceito no leste, infraestrutura relevantemente separado. Meu auto-serviço casou-se e o “s” nasce, deu origem ao autosserviço.
Em algumas palavras é recém-nascido, em outras, é veterano. O prefixo faz sempre diferença e... Ufa! Prefixo sem hífen.
Extra-humano, pré-história, super-homem, ultra-arquivo. Minha refeição é interrompida quando comer no gerúndio não cabe no final da linha. Hífen me transmite qual tipo de guarda eu posso citar, se é a bagunça do meu guardaroupa ou a competência do guarda-noturno. Gente é muito traço!
E se eu tiver grávida? Lá me vou parir um “s” para minha ultrasson.
Com hífen ou sem hífen, o português vai mudando, separa aqui, gruda ali, e misturam-se as formas até vim um ser na próxima invenção e ser contra a reforma. Os pequenos nascerão sabendo e os que não sabem saberão com dificuldade. E tudo isso para quê? Uma pseudofacilidade.

sábado, 3 de outubro de 2009

• Sentimento Esportivo

Torcer é a mistura indescritível de sentimentos abstratos.

O torcedor não realiza, ele sonha, espera, comemora.

Amor é o sentimento mais comum, a incessante obsessão do torcedor fanático ou até mesmo o não-fanático da origem ao nobre sentimento pelo time ou seleção e quando isso acontece já não cabe mais espaço para tanto jubilo.

Ir a um jogo e ver a sua seleção ou time vencer, fortalece o laço invisível de cada torcedor.

Torcer pela pátria reúne a mais espetacular torcida que, automaticamente atribui autoconfiança, força de vontade e garra a seleção.

A união nos vibrantes momentos de comemoração mostra que tudo é intensamente mais do que uma simples competição.

Porém, quando o mar do azar resolve trazer a sua maré, morre-se o sorriso da torcida, as vozes se calam, os olhos se fecham, as lágrimas escorrem, não porque o time perdeu, entretanto torcedores devotam toda confiança a vitória, sufocando a euforia.

Quando por um segundo, não sei se por amuleto, sorte, ventura ou competência, a bola dar o ar da graça a trave e se concretiza o gol, é aí então que tudo muda, o coração salpica, bate fortemente acelerado e orgulhosamente transparente.

E assim continua, a cada lance um gostinho diferente, a cada jogo o insaciável desejo de intermináveis gols e no olhar transmite-se a alegria e a pressão com que se torce.

Vencer, perder, empatar o que realmente vale e o amor, a persistência e a lealdade.

• Força Pensante



A força do nosso pensamento define o nosso bem-estar diário.

O pensamento positivo é a fórmula para seguir em frente com coisas boas. O inverso pode levar-nos a maldição e a aproximação de males irrevogáveis.

Somos escravos do pensamento, monitorados pela força da palavra que, quando se é proferida inadequadamente nos traz arrependimentos ou lágrimas.

A nossa mente divide-se em dois critérios: O bom e o mau. A adoração pelo caráter benigno de um ser reflete maior probabilidade do primeiro critério. O mesmo ao segundo.

Pensamentos precisam ser diferentes, a mistura de idéias deu origem ao conhecimento.

Posso dizer-te mil palavras e você não acreditar nelas, mas basta olhar nos meus olhos, intensificar o meu sorriso e imediatamente meus pensamentos confirmarão meu dito.

Seus atos são conseqüências dos seus pensamentos.

E você tem o poder de escolher qual critério deve perdurar.

SOUZA, Géssica